Frequentemente a Justiça do Trabalho mineira julga processos
envolvendo entes públicos que contratam empregados pelo regime da CLT,
mediante a realização de concurso público. Um desses casos foi
identificado pelo juiz Paulo Eduardo Queiroz Gonçalves, titular da 1ª
Vara do Trabalho de Passos, como um exemplo de banalização do instituto
da estabilidade do servidor público. De acordo com os dados do processo,
o prefeito da cidade de Delfinópolis-MG, por meio de Decreto, declarou
desnecessário o cargo público ocupado por um empregado efetivo do
Município, afastando-o de suas funções. Conforme salientou o magistrado,
a princípio, pode parecer que o ato do prefeito não apresenta
irregularidades. Isso porque o artigo 41, parágrafo 3º, da Constituição,
faculta ao chefe do Poder Executivo a declaração da desnecessidade do
cargo ocupado por servidor estável, que deverá ficar em disponibilidade,
com remuneração proporcional ao seu tempo de serviço, até o seu
adequado aproveitamento em outro cargo. Entretanto, após análise do
conjunto de provas, o juiz descobriu que, por trás da aparente
legalidade do ato do prefeito, existia um histórico de perseguição
política, sendo esse o verdadeiro motivo do afastamento do servidor. Em
razão disso, o julgador decidiu que o reclamante deve ser reintegrado ao
emprego e indenizado pelos danos morais sofridos.
O Decreto
34/2009 declarou desnecessário o cargo de ¿comprador¿ exercido pelo
reclamante, que tinha como atribuições realizar a compra de materiais
utilizados na prefeitura. De acordo com o Decreto, a motivação que
determinou a desnecessidade do cargo é o fato de que as requisições e
compras seriam feitas diretamente pelo chefe de cada departamento, a fim
de imprimir maior agilidade e garantir eficiência ao serviço público.
Entretanto, ao analisar a questão, o juiz entendeu que as provas não
confirmaram a motivação expressa no Decreto. Muito pelo contrário, na
avaliação do julgador, ficou comprovado que o servidor foi afastado do
cargo por outros motivos. Isso porque o prefeito havia concedido uma
entrevista à imprensa local, noticiando a implantação de um suposto
departamento de licitação, a fim de tornar as compras mais
transparentes, oferecendo oportunidades para um maior número de
fornecedores. No entender do juiz, esse fato, confirmado em audiência
pelo preposto do Município, revela que a motivação apresentada pelo
prefeito não corresponde àquela descrita no Decreto, caracterizando,
assim, desvio de finalidade do ato administrativo.
Conforme
frisou o magistrado, os atos discricionários da Administração Pública,
embora permitam ao agente responsável uma maior liberdade de conduta,
conforme critérios de conveniência e oportunidade, a partir do momento
em que expõem os motivos que justificam e determinam a sua respectiva
realização, vinculam o agente público a tal motivação. Mas, na visão do
julgador, ainda não era esse o verdadeiro motivo do afastamento do
servidor público. Os depoimentos das testemunhas revelaram que o
Município de Delfinópolis é basicamente dividido em duas correntes
políticas: os afiliados ao PMDB, denominados "lavaredas", do qual o
reclamante participa; e os partidários do PSDB, denominados "tucanos",
que atualmente ocupam o poder na prefeitura. Além disso, ficou
comprovado que não houve nenhuma mudança no organograma estrutural da
prefeitura, sendo que as funções exercidas pelo reclamante são
atualmente realizadas por outros servidores, inclusive ocupantes de
cargos em comissão. Há ainda duas ações judiciais movidas anteriormente
pelo reclamante contra o réu, por motivo de perseguição política.
A
partir da análise desses fatos, concluiu o magistrado que a suposta
justificativa de desnecessidade do cargo ocupado pelo servidor foi
apenas um artifício utilizado pelo prefeito para afastar um adversário
político. Foi uma tentativa de substituir um servidor independente, que
provavelmente não compactuava com as ideias do prefeito, por
funcionários da confiança dele. Nesse contexto, o juiz sentenciante
declarou a nulidade do decreto editado pelo prefeito e determinou a
reintegração imediata do reclamante a seu ofício. O magistrado condenou o
Município ao pagamento de uma indenização de R$10.000,00, a título de
danos morais, por entender que a conduta do prefeito, utilizando-se da
máquina administrativa municipal com notório desvio de finalidade,
acarretou ofensa à dignidade do reclamante, que foi submetido a
constrangimentos na pequena cidade do interior. A sentença foi
confirmada pelo TRT de Minas.
( nº 00551-2009-070-03-00-4 )
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