domingo, 23 de janeiro de 2011

TJ/RR: Artigo: Peculiaridade do sistema jurídico canadense

O Canadá é uma monarquia constitucional. É um Estado Federal com governo central, formado por dez províncias e três territórios. Anoto de início que a nominação província refere-se ao Estado Federado no Brasil e ao Bundesland na Alemanha; é apenas uma questão de nomenclatura, pois as províncias canadenses possuem ampla autonomia. O Canadá faz parte do Império Britânico, formalmente, tanto quanto a Austrália, a Escócia, a Índia, a Irlanda, todavia é um país totalmente independente, sua participação no Império Britânico não implica em subordinação.
O Canadá é um Estado parlamentarista onde o Primeiro Ministro tem atividade de Chefe de Governo, com participação permanente junto ao Parlamento, este formado pela Câmara dos Comuns e pelo Senado (Senado Vitalício à semelhança do Brasil Imperial), mais um Governador Geral representante da Rainha do Império Britânico.
De maneira prática o Governador Geral não exerce nenhuma atividade político-administrativa, apenas representante da Rainha em território canadense, nas atividades sociais, todavia, assina todos os documentos de governo canadense, que só entra em vigor após sua chancela, os quais não pode recusar. Em verdade, seria a participação na fase externa do processo legislativo com a promulgação e publicação da lei. O Governador Geral é nomeado pelo Primeiro Ministro sem interferência da Rainha, e pode ser canadense, britânico ou migrante.
Nesse contexto do Estado canadense, destaca-se o bijuralismo com o Civil Law na província de Quebec e o Common Law nas demais províncias, no sentido jurídico territorial em Quebec com o direito civil e direito material nas outras províncias. Lembro que o Common Law teve seu início na Inglaterra, no ano de 1066, com a conquista dos Normandos, estabelecendo uma ficção jurídica de padrão geral. O bijuralismo do sistema jurídico canadense é consequência de sua evolução histórica, pois a província de Quebec foi colonizada pelos franceses que impuseram o sistema Civil Law e mesmo depois com os ingleses, houve um acordo obedecendo o direito daquele povo. Considerando-se o fato prático, depois da conquista aos ingleses retornaram à França os oficiais, as pessoas privilegiadas financeiramente, no entanto, a maioria dos funcionários públicos permaneceu em território canadense, nomeadamente, os cartorários, limitados ao Civil Law.
A igualdade na desigualdade fica evidente na composição da Suprema Corte, considerando que dos nove juízes, três devem ter formação no Civil Law, todavia, apenas uma das dez províncias adota esse sistema jurídico.
Atualmente o Canadá segue a Carta de Direitos e Liberdades, de 1982, que complementa sua Constituição, de 1867, a serem observados esses dois documentos jurídicos em todo território canadense, tanto no Civil Law como no Common Law. A Carta de Direito e Liberdades canadense destaca o elemento multicultural na formação daquele país, onde a tolerância e solidariedade são direcionadoras da interpretação, integração e aplicação do direito, na concretude do direito de igualdade, por meio dos direitos negativos (não poder fazer), direito positivo (direito de igualdade, direitos culturais) e direitos de grupos (culturais, linguísticos e indígenas).
A Carta de Direitos e Liberdades faz parte da Constituição do Canadá, no âmbito do federalismo Canadense, aplicando-se tanto nas relações de Direito Público quanto nas relações de Direito Privado. Lembro que não há hierarquia entre direitos e liberdades.
Merece destaque os Tribunais Administrativos existentes no Canadá com atuação e decisões reconhecidas e respeitadas por todos. Se os Tribunais Administrativos Trabalhistas tem maior tradição, certamente os Tribunais Administrativos de Direitos Humanos, atualmente, criam maior visibilidade aquele país.
Em termos práticos, na concretude do Direito, conforme noticiado pelo juiz William Ian Corneil Binnie, da Suprema Corte do Canadá, mais de 90% (noventa por cento) dos litígios que chegam ao Judiciário são resolvidos em conciliação. Um dos fatores a desestimular o litígio seria o alto custo do processo e de advogados.
O sistema jurídico canadense, certamente, apresenta peculiaridades necessárias de se conhecer quanto da sua aplicação, como subsídio do Direito neste mundo globalizado.

Gursen De Miranda
Magistrado (RR). Professor (UFRR). 

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