O empregador pode rescindir o contrato de trabalho de seus empregados quando entender necessário. Porém, a dispensa com caráter discriminatório é considerada arbitrária, dando ao empregado o direito à reintegração. Assim decidiu a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, ao confirmar a decisão que mandou reintegrar empregado da Brasil Telecom, portador de câncer de pele, demitido injustificadamente após 28 anos de serviço.
O trabalhador, economista, foi admitido pela empresa como contínuo, em julho de 1973. Ao longo do contrato de trabalho foi subindo na empresa, passando a ocupar os cargos de assistente técnico, gerente comercial, coordenador de compras e consultor. Em setembro de 2001 ele foi demitido, sem justa causa, logo após retornar de uma cirurgia. No dia seguinte à dispensa ele foi aposentado por invalidez, pelo INSS.
Portador de neoplasia nodular epitelióide (câncer de pele) em estado avançado, o trabalhador ajuizou reclamação trabalhista em 2002 por entender que a dispensa foi a maneira encontrada pela empresa de se “desvencilhar de um empregado que vinha apresentando histórico de doença incapacitante”. Pediu nulidade da dispensa, reintegração ao emprego, restabelecimento do plano de saúde e indenização por danos morais.
A Sétima Vara do Trabalho de Curitiba (PR), ao julgar a ação, aceitou o pedido de nulidade da dispensa e mandou reintegrar o trabalhador, devolvendo-lhe o direito ao plano de saúde. Porém, negou pedido de indenização por danos morais por entender que os prejuízos não foram demonstrados. Empregado e empregador recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR).
O Regional entendeu que a dispensa foi discriminatória, e manteve a reintegração concedida liminarmente. Quanto aos danos morais, avaliou que a situação não necessitava de demonstração dos danos, porque estes já estavam implícitos no ato da despedida considerada arbitrária. A empresa foi condenada a pagar R$ 15 mil a título de danos morais.
A empresa interpôs recurso de revista ao TST. Em suas alegações, repetiu os argumentos de defesa, negando a discriminação. Disse que a dispensa do empregado foi apenas um ato comum de gestão e que desconhecia, à época da demissão, a doença do empregado. Por fim, defendeu seu direito de despedir o empregado, sem justa causa, assegurando-lhe o pagamento das verbas rescisórias devidas, sob o argumento de que não existe no ordenamento jurídico nenhuma lei que ampare o pedido de reintegração no emprego do empregado portador de neoplasia.
O ministro relator do acórdão no TST, Lelio Bentes Corrêa, não aceitou os argumentos empresariais. Para ele, a empresa, ao negar o caráter discriminatório e arbitrário da dispensa deveria ter produzido prova da existência de outros motivos – lícitos – para a prática do ato, mas não o fez. “A despedida imotivada de empregado portador de doença grave autoriza presumir, em tese, seu caráter discriminatório e arbitrário”, disse ele.
Quanto à alegada falta de previsão legal para amparar a reintegração de portador de doença grave, o ministro assinalou que “o fato de o sistema jurídico pátrio não contemplar a garantia provisória no emprego para esse empregado não impede o julgador trabalhista de valer-se da prerrogativa inserta no artigo 8º da Consolidação das Leis do Trabalho para aplicar à espécie os princípios gerais do Direito, notadamente os princípios constitucionais assecuratórios do direito à vida, ao trabalho e à dignidade da pessoa humana, insculpidos nos artigos 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, cabeça e XLI, 170 e 193 da Constituição da República, além da previsão contida no artigo 7º, I, da Lei Magna, que veda a despedida arbitrária, com conteúdo discriminatório”.
Quanto à restituição do plano de saúde, o ministro Lelio disse que o TST tem decidido de forma reiterada de que a aposentadoria por invalidez apenas suspende o contrato de trabalho e os efeitos principais do vínculo, como a contagem por tempo de serviço, o pagamento de salários e a prestação de serviços. Os efeitos do contrato não vinculados diretamente à prestação de serviços, como o direito ao plano de saúde, permanecem inalterados.
O ministro manteve a condenação por danos morais por entender que a conduta da empregadora consistente na dispensa arbitrária e discriminatória do empregado portador de doença grave constitui ato ilícito capaz de ensejar o pagamento de indenização. “Não depende de comprovação que o abalo psicológico sofrido pelo empregado afetou direitos inerentes à própria personalidade, no caso, a sua integridade psíquica, o que enseja a reparação por danos morais”, conclui.
O recurso da empresa não foi conhecido porque a parte não conseguiu demonstrar violação de lei nem apontou divergência de julgados aptos ao processamento do apelo.
(Cláudia Valente)
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