Um tema muito debatido na Justiça do Trabalho mineira é a questão da responsabilidade do empregador nas situações em que o empregado é vítima de crime praticado por terceiros, durante o período em que se encontra a serviço da empresa. Vivemos uma realidade marcada pelo aumento da criminalidade, da impunidade e da falta de empenho por parte das autoridades competentes em solucionar esses problemas. É evidente que a Segurança Pública compete ao Estado e que o empregador não tem o poder de prever e controlar a ação de criminosos, a fim de oferecer proteção total a seus empregados. Mas, por outro lado, o empregador tem a obrigação de adotar, no campo da saúde e segurança ocupacional, os procedimentos necessários para evitar ou reduzir os riscos inerentes ao trabalho.
É claro que não existem procedimentos infalíveis de segurança, mas é importante que o empregador tenha um senso apurado em relação ao seu dever geral de cautela. E essa obrigação patronal deve ser reforçada ainda mais diante da crescente criminalidade. Nesse sentido, a conduta patronal que expõe o empregado a situações perigosas, negligenciando a sua segurança em prol do lucro da atividade empresarial, deve ser caracterizada como ilícita. Assim se posicionou a juíza Jaqueline Monteiro de Lima, à época, titular da 9ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, ao julgar uma reclamação trabalhista ajuizada por um motorista, que foi baleado em assalto, durante a jornada. No entender da magistrada, a empresa contribuiu para a ocorrência do incidente e, por isso, deve ser responsabilizada.
Durante um assalto violento, o motorista levou um tiro, que atingiu a sua coxa esquerda, o órgão genital e a barriga. O assaltante sabia que havia um cofre com dinheiro no veículo dirigido pelo trabalhador. De acordo com as conclusões do laudo pericial, o empregado não ficou incapacitado para o trabalho em virtude do acontecimento, restando algumas sequelas como dores físicas, lesão permanente com formação de cicatrizes e problemas íntimos delicados, além do trauma psicológico. A reclamada alegou em sua defesa que não tem como controlar a violência urbana cotidiana. Entretanto, a juíza de 1º grau rejeitou esse argumento.
Conforme frisou a magistrada, não se trata de delegar à reclamada a responsabilidade pela segurança pública, que é incumbência do Estado, mas, sim, de responsabilizá-la pelo fato de ter contribuído de forma indireta para a ocorrência do assalto. Isso porque a empresa estimulou a ação criminosa ao instalar cofres para a guarda de numerário nos caminhões e ao determinar que o reclamante recebesse em dinheiro pelas entregas realizadas, o que representa um grande atrativo para os assaltantes. De acordo com as ponderações da juíza, caberia à reclamada adotar outro procedimento para a cobrança como, por exemplo, boleto bancário ou depósito em conta bancária, o que não foi feito. A empresa, ao invés de adotar medidas preventivas para evitar o incidente, preferiu resguardar sua segurança financeira e, com o intuito de obter vantagem econômica, colocou em risco a vida do empregado.
A preposta da empresa declarou que são registrados, em média, um a dois assaltos por mês envolvendo empregados da reclamada. Conforme reiterou a magistrada, isso demonstra que a empresa tinha ciência do perigo iminente dos assaltos. ¿Não se trata, portanto, de se negar o nexo de causalidade, invocando o aspecto relativo à segurança pública,ou se tratar de ato de terceiro,mas sim o fato de que foi o próprio empregador quem proporcionou atrativos para o assalto e colocou o reclamante em risco. Se assim agiu, adotou conduta que preteriu a segurança pessoal do empregado, preferindo obter as vantagens econômicas que o pagamento em espécie lhe oferece. Se assim agiu, deve ser responsabilizada a reclamada pelos danos causados ao empregado. Não é mera hipótese de assalto, segurança pública, mas sim de favorecimento e constituição de condições propícias para o assalto, colocando a vida dos empregados em risco permanente¿ ¿ finalizou a juíza sentenciante, concluindo que o empregador agiu com culpa, por submeter seu empregado a condições de trabalho inseguras e perigosas. Em face disso, a reclamada foi condenada ao pagamento de uma indenização por danos materiais, morais e estéticos, no valor de R$50.000,00.
( nº 00661-2007-009-03-00-0 )
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