Mesmo tendo que manter o registro do IP (número que identifica cada computador na internet) e remover conteúdos ofensivos, a Google Brasil Internet Ltda. não é obrigada a fazer controle prévio do conteúdo do Orkut, seu site de relacionamentos. Esse entendimento foi adotado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou pedido de indenização contra a empresa.
Um usuário alegou que foi ofendido pelo conteúdo de página no Orkut. Em primeira instância, determinou-se a retirada de um álbum de fotografias e dos respectivos comentários, além de indenização de R$ 8.300 por danos morais. A Google recorreu, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou o pedido por entender que a empresa teria assumido o risco da má utilização do serviço. Para o tribunal mineiro, o site deveria ter desenvolvido ferramentas para coibir abusos e ainda ter identificado o usuário responsável pelas ofensas.
No recurso ao STJ, a Google alegou haver julgamento extra petita (quando o juiz concede algo além do que foi pedido na ação), já que em nenhum momento foram solicitadas informações sobre os usuários. Também afirmou que, não tendo participado da criação do perfil ofensivo no Orkut, não poderia ser responsabilizada e ser obrigada a indenizar a vítima. Argumentou que, segundo os artigos 182 e 927 do Código Civil, o causador do ilícito é o único obrigado a indenizar.
A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, entendeu que, apesar de o serviço ser oferecido gratuitamente, há relação de consumo, já que a Google consegue divulgação de sua marca e serviços com o site de relacionamentos e tem remuneração indireta. Portanto o Código de Defesa do Consumidor (CDC) seria aplicável a essas relações. Por outro lado, o Orkut presta serviço de provedor de conteúdo – disse a ministra Andrighi –, sem participar ou interferir no que é veiculado no site. O relacionamento entre os usuários e a criação das “comunidades” são livres.
A relatora ponderou que a responsabilidade da Google deve ser restrita à natureza da atividade por ela desenvolvida. Para a ministra, parte dos serviços oferecidos pela empresa via Orkut é o sigilo, a segurança e a inviolabilidade dos dados cadastrais dos clientes. “No que tange à fiscalização das informações postadas pelos usuários, não se trata de atividade intrínseca ao serviço prestado, de modo que não se pode reputar defeituoso, nos termos do artigo 14 do CDC”, acrescentou.
Para a ministra Andrighi, o dano moral não pode ser considerado risco inerente à atividade dos provedores de conteúdo, já que suas atividades não implicam, para terceiros, riscos diretos maiores do que qualquer outra atividade. Por isso, ela considerou que não se aplica a esses provedores a responsabilidade objetiva prevista pelo artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.
Quebra de sigilo
A ministra também asseverou que o controle prévio de conteúdos seria equiparável à quebra de sigilo das comunicações, vedado pelo artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal. “Não bastasse isso, a verificação antecipada do conteúdo eliminaria – ou pelo menos alijaria – um dos maiores atrativos da internet, que é a transmissão de dados em tempo real”, observou.
A própria subjetividade do dano moral seria, na visão da ministra, um impedimento para a verificação prévia do conteúdo. Não seria possível fixar parâmetros prévios do que seria ofensivo ou não. Os sites, entretanto, ainda têm responsabilidade sobre o tráfego de informações. “Há, em contrapartida, o dever de, uma vez ciente da existência de mensagem de conteúdo ofensivo, retirá-la imediatamente do ar”, esclareceu a ministra.
Ela destacou também que a Constituição veda o anonimato e que o IP (Internet Protocol) deve ser exigido na prestação de certos serviços. No caso, a Google mantém registros dos IPs dos computadores utilizados para acessar o Orkut. Ela observou que a empresa realmente retirou o conteúdo ofensivo do ar assim que foi informada da situação. Além disso, a Google mantém canal para as pessoas, usuárias ou não, que tiveram suas identidades “roubadas” no Orkut, solicitarem a exclusão da conta e denunciarem outros abusos.
A ministra concluiu afirmando que não houve no processo nenhum pedido para fornecer os dados que poderiam identificar o verdadeiro autor da ofensa. “Noto, por oportuno, a importância de o IP ser mantido em absoluto sigilo, sendo divulgado apenas mediante determinação judicial, pois, a partir dele, é possível realizar ofensivas direcionadas ao respectivo computador”, alertou. A ministra acolheu o pedido da Google e afastou a obrigação de indenizar.
Coordenadoria de Editoria e Imprensa
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