quinta-feira, 22 de março de 2012

Empregados têm dificuldade de se desligar do trabalho, diz Ipea

Um terço sente que o tempo livre vem diminuindo por conta do emprego. Entretanto, apenas 21,5% afirmam pensar em trocar de trabalho.

Do G1, em São Paulo

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou nesta quarta-feira (21) os resultados da pesquisa Sistema de Informações de Percepção Social Trabalho e Tempo Livre, que ouviu 3.796 pessoas residentes em áreas urbanas, das cinco regiões do país, com ao menos um trabalho remunerado. O levantamento mostra que quase  metade dos entrevistados tem dificuldade para se desligar totalmente do trabalho, mais de um terço sente que o tempo livre vem diminuindo por conta do emprego e mais de um terço considera que o tempo dedicado ao trabalho compromete a qualidade de vida. No entanto, somente 21,5% dos entrevistados afirmam pensar em trocar de trabalho por causa do tempo que gastam com ele.

As informações, colhidas em âmbito domiciliar, por meio de questionário com 64 questões, versaram sobre o tempo gasto no trabalho e sobre seus impactos na vida dos entrevistados.

Não desliga
Quase a metade dos entrevistados (45,4%) afirma ter dificuldade para se desligar totalmente do trabalho, mesmo após o término da jornada. Entre as razões apontadas estão a necessidade de ficar de prontidão, para a realização de alguma atividade extraordinária (26,0%); a necessidade de planejar ou desenvolver alguma atividade de trabalho, mediante internet, celular, etc. (8,0%); e necessidade de aprender um conjunto de coisas sobre o próprio trabalho (7,2%). Nesse caso, os trabalhadores subordinados têm chance 1,6 vezes maior de efetivamente conseguir se afastar do trabalho que os autônomos (por conta própria e pequenos empregadores) após o horário de término de sua jornada diária.

Outros compromissos
Menos de um terço dos entrevistados (29,7%) consegue assumir outros compromissos regulares para além de seu trabalho remunerado. Entre os que conseguem assumir, destacam-se as atividades de devoção religiosa (7,1%), de realização de estudos (5,9%) e de treinamento esportivo (5,9%). Os entrevistados que conseguem desenvolvê-las destinam 10,7 horas semanais em média (sendo que a mediana corresponde a 7 horas semanais).

Comparando quem tem até ensino médio incompleto e ao menos nível médio completo, verifica-se que o segundo grupo tem chance 1,7 vezes maior de conseguir assumir outros compromissos regulares. E contrastando os entrevistados que têm renda familiar per capita de até R$ 400 mensais e os que têm renda acima desse valor, percebe-se que os últimos têm uma chance 1,5 vezes maior de conseguir se dedicar às religiões, aos estudos, aos esportes.

Tempo livre
Mais de um terço dos entrevistados (37,7%) sente que o tempo livre vem diminuindo no período recente, por conta do tempo diariamente gasto com o trabalho remunerado. De maneira mais específica, eles afirmam que isso ocorre por causa do excesso de atividades exigidas no trabalho (18,0%), devido à obrigação de levar atividades laborais para realizar casa (5,3%) e por conta do maior tempo gasto com transporte para o trabalho (4,8%), por causa da maior exigência de qualificação para o trabalho (3,7%), por causa de ter que estar de prontidão para emergências no trabalho (2,6%), entre outras razões. Ao comparar os que trabalham até 44 horas por semana (que é a jornada legalmente definida no país) e os que trabalham mais que esse número, nota-se que o segundo grupo tem chance 1,8 vezes maior de relatar que seu tempo livre vem diminuindo.

Ao contrastar os que habitam as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e os que moram no Sul e Sudeste, os últimos têm chance 1,6 maior de mencionar que seu tempo livre vem diminuindo, devido ao tempo gasto com o trabalho.

Qualidade de vida
Mais de um terço dos entrevistados (39,5%) considera que o tempo cotidianamente dedicado ao trabalho remunerado compromete a qualidade de vida. Isso ocorre principalmente por conta de o trabalho gerar cansaço e estresse (13,8%), devido a ele comprometer as relações amorosas e a atenção à família (9,8%), por causa do prejuízo causado ao estudo, ao lazer e ao esporte (7,2%), devido a ele afetar negativamente as relações de amizade (5,8%) e gerar perda de motivação para o próprio trabalho (2,9%).

Comparando os que trabalham até 44 horas semanais e os que trabalham mais que isso, verifica-se que o segundo grupo tem chance 1,6 vezes maior de afirmar que esse comprometimento é significativo. E contrastando os que residem nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e os que habitam o Sul e Sudeste, constata-se que os últimos têm chance 1,5 vezes maior de relatar problemas de qualidade de vida por conta do tempo diariamente exigido no trabalho.

Reações
Quase a metade dos entrevistados (48,8%) apresenta reações negativas quando necessita dedicar parcela de seu tempo livre a atividades próprias do trabalho remunerado. Entre essas reações negativas, estão conformidade por precisar manter o trabalho (36,7%), tristeza por não sentir prazer no trabalho (5,1%) e revolta por achar que o tempo livre deveria ser dedicado a outras atividades (que não o trabalho, 7,0%).

Ao comparar os trabalhadores subordinados e os autônomos, nota-se que os primeiros têm uma chance 2,1 vezes maior de reagir contra esse uso do tempo livre. Ao contrastar os que estão há menos tempo de vínculo no trabalho (até 36 meses) e os que estão há mais que isso, os primeiros têm chance 1,4 vezes maior de reagir contra o uso do tempo livre para trabalhar.

Os trabalhadores com até 38 anos têm chance 1,4 vezes maior de rejeitar o uso do tempo livre para trabalhar que os com 39 anos de idade ou mais.

Troca de trabalho
Apesar de uma parcela oscilante (entre 30% e 50%) dos entrevistados considerar que o tempo dedicado ao trabalho remunerado afeta negativamente seu tempo livre, com todas as consequências em termos de redução da qualidade de vida (geração de cansaço e estresse, comprometimento das relações familiares, impossibilidade de realização de atividades etc.), uma parcela inferior (21,5%) dos entrevistados afirma efetivamente pensar em trocar de trabalho por causa do tempo que gasta com ele, avaliado como excessivo. Comparando aqueles com até 38 anos e aqueles com 39 anos de idade ou mais, verifica-se que os primeiros têm uma chance 2,0 vezes maior de cogitar trocar de trabalho.

Contrastando aqueles que têm renda familiar per capita de até R$ 400 mensais e os que têm renda acima desse valor, percebe-se que os primeiros têm uma chance 1,7 vezes maior de pensar em trocar de trabalho.

Contrastando os que possuem menos tempo de empresa (até 36 meses) e os que possuem mais que isso, observa-se que os primeiros têm uma chance 1,6 vezes maior de pensar em trocar de trabalho, por conta do tempo que se gasta com ele.

Assim, a pesquisa mostra que, apesar da percepção comum de que o tempo de trabalho afeta significativa, crescente e negativamente a qualidade de vida, somente um quinto dos entrevistados afirma realmente pensar em trocar de ocupação por conta disso. Trocar de ocupação ainda parece ser algo impactante para o cotidiano da população, mesmo quando a ocupação atual, com seu tempo de trabalho excessivo, prejudica boa parte do cotidiano. Apenas os trabalhadores mais jovens, com menor renda e com menor tempo de vínculo parecem considerar menos impactante a troca de ocupação, com todos os efeitos desorganizadores que ela provavelmente tem para sua vida cotidiana.

Redução da jornada
Em relação à possível mudança na jornada de trabalho (redução de 44 horas semanais para um número inferior), 36,2% afirmam que não perceberiam diferenças em caso de mudanças. Os demais entrevistados (63,8%), que perceberiam diferenças em suas vidas com a redução de jornada distribuem-se pelas seguintes alternativas de uso do tempo livre que surgiria com tal redução: 24,9% usariam esse tempo para cuidar da casa e da família; 12,3% o utilizariam para estudar; outros 12,3% o destinariam para descanso puro e simples; e 5,7% o dedicariam à prática de esporte/recreação.



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