Em mais um julgamento sobre excessos verbais
cometidos por advogado no curso do processo, o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) reafirmou seu entendimento de que a imunidade profissional
prevista na Constituição não é absoluta. Dessa vez, a Quinta Turma
reformou decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e
condenou um advogado de Pouso Alegre por calúnia e difamação contra
outro profissional.
Os ministros acompanharam integralmente o
voto do relator, desembargador convocado Adilson Macabu, e impuseram ao
advogado penas de detenção por calúnia (seis meses) e difamação (três
meses). No entanto, como a queixa-crime que deu origem ao processo foi
apresentada em 2004 e o prazo prescricional para esses delitos é de
quatro anos, a Turma, de ofício, reconheceu a prescrição da pretensão
punitiva.
Além de se enfrentarem profissionalmente em uma ação
indenizatória que tramitava na 1ª Vara Cível da Comarca de Pouso Alegre,
os advogados estavam em campos políticos opostos: um atuava ao lado do
prefeito da cidade, enquanto o outro era vice-presidente de um partido
adversário. Na ação, patrocinada pelo advogado oposicionista, uma
moradora exigia indenização do prefeito, porque este a teria ofendido
publicamente.
Contra a honra
A certa
altura, ao redigir algumas peças dirigidas ao juiz, o advogado da autora
acusou o colega de constrangimento ilegal, crime previsto no artigo 146
do Código Penal, e também de outros comportamentos condenáveis, como
usar de prestígio para buscar objeto ilícito no processo, faltar com a
ética profissional e induzir a erro o próprio juiz.
O que
motivou essas manifestações do profissional foi o fato de sua cliente,
pessoa de baixa instrução, ter sido levada por assessores da prefeitura
ao gabinete do prefeito e, na presença deste e de seu advogado, ter
assinado documento desistindo da ação indenizatória. Posteriormente, a
mulher declarou que foi pressionada a assinar e que não conhecia o
conteúdo exato do documento.
O advogado do prefeito processou o
colega por calúnia e difamação, em razão dos termos colocados nas
petições, mas perdeu em primeira e segunda instâncias. O TJMG considerou
que havia no processo indícios da prática de constrangimento ilegal
contra a mulher, por isso o advogado autor da acusação não teria
conhecimento da inocência do outro, o que afastaria a calúnia. O
tribunal ressaltou que, para a configuração do crime de calúnia, seria
indispensável que ficasse comprovada a disposição de acusar alguém
sabidamente inocente.
Ao julgar recurso especial contra a
decisão do TJMG, o desembargador convocado Adilson Macabu considerou,
porém, que o advogado da autora da ação contra o prefeito “extrapolou
todos os limites do razoável e do mero exercício de sua profissão”, ao
fazer uma acusação criminal sem provas, “o que acaba por afastá-lo do
manto protetor da imunidade judiciária que o protege durante a prática
de atos inerentes à sua profissão”.
O relator disse que, “nos
crimes contra a honra, devem-se observar não apenas as palavras
utilizadas pelo ofensor, mas, principalmente, o contexto em que foram
proferidas, bem como a motivação do agente dando ensejo a agressões
descabidas, porquanto afastadas do contexto dos autos e dos limites da
lide”.
Segundo ele, “as palavras proferidas pelo querelado
visavam atingir a honra do querelante, por ser este advogado do prefeito
da cidade, adversário político daquele”. O magistrado citou precedentes
do STJ segundo os quais a inviolabilidade garantida pela Constituição
aos advogados não é uma imunidade absoluta, admitindo punição em caso de
excessos.
Após votar pela aplicação das penas mínimas previstas
no Código Penal, o relator assinalou que os delitos de calúnia e
difamação preveem o máximo de dois e um ano de detenção,
respectivamente, o que significa que o prazo prescricional, nesses
casos, é de quatro anos. “A queixa-crime foi recebida em 23 de agosto de
2004, sendo este o único marco interruptivo da contagem do prazo
prescricional, tendo em vista que a sentença absolutória foi mantida em
sede de apelação”, disse. Como já transcorreram mais de seis anos, foi
reconhecida de ofício a prescrição da pretensão punitiva.
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