A proteção instituída pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) deve abranger toda mulher submetida à violência de qualquer tipo no âmbito da unidade doméstica, da família ou de relação íntima de afeto. Com essa consideração, a Quinta Turma, em decisão unânime, negou habeas corpus a homem acusado de agredir a cunhada, irmã de sua companheira, que morava com o casal havia mais de um ano.
Consta dos autos que o paciente foi denunciado pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF) pela prática do crime previsto no artigo 129, parágrafo 9.º, do Código Penal. Em primeira instância, a denúncia não foi recebida. Segundo o juiz, a vítima, cunhada, não integrava a descrição típica do crime.
Inconformado, o MPDF interpôs recurso, que foi provido por maioria no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF). Segundo entendeu o tribunal, há parentesco por afinidade, nos termos do parágrafo 1º do artigo 1.595 do Código Civil, ficando configurada, em tese, a violência doméstica contra a mulher no âmbito da família – “compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa”.
Com base no voto vencido, que não considerava a Lei Maria da Penha aplicável em relação à cunhada, a defesa interpôs embargos infringentes. O TJDF negou provimento. “A pretensão do legislador foi abarcar toda mulher em situação de desigualdade e submetida a sevícias por quem quer que seja no âmbito da convivência doméstica e familiar, dispensando a existência de relação amorosa ou afetividade profunda”, considerou o desembargador.
Qualquer situação
Segundo o TJDF, o legislador não tratou apenas da proteção à mulher na convivência conjugal ou marital. “Qualquer situação de risco, no âmbito familiar ou doméstico, em que seviciada a mulher, abre espaço para submissão do agente aos ditames da Lei 11.340”, considerou.
No habeas corpus dirigido ao STJ, a defesa sustentou que não há notícia sobre relação íntima de afetividade entre o paciente e a suposta vítima, nem de submissão financeira ou moral da agredida ao acusado, uma vez que eles apenas residiam na mesma casa, o que, por si só, seria incapaz de justificar a aplicação da Lei Maria da Penha.
A Quinta Turma discordou e negou o habeas corpus. “A Lei 11.340 tem o intuito de proteger a mulher da violência doméstica e familiar que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”, observou a ministra Laurita Vaz, relatora do caso. Segundo ela, para que a lei seja aplicada, é preciso que a agressão seja cometida “no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto”.
Ela observou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, “a relação existente entre os sujeitos ativo e passivo deve ser analisada em face do caso concreto, para verificar a aplicação da Lei Maria da Penha, sendo desnecessário configurar a coabitação entre eles”. No caso em julgamento, acrescentou a ministra, a vítima era irmã da companheira do agressor e fazia mais de um ano que vinha morando na mesma casa.
“Nesse contexto, inarredável concluir pela incidência da Lei n.º 11.343, tendo em vista o sofrimento físico em tese sofrido por mulher em âmbito familiar, nos termos expressos do artigo 5.º, inciso II”, concluiu a ministra.
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