sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

TRT 15.ª Região - Negado vínculo de emprego a faxineira que prestava serviço a empresa do ramo de projetos elétricos

A única testemunha da trabalhadora contradisse as próprias
alegações contidas na inicial do processo, ensejando, inclusive,
que o juízo ordenasse a expedição de ofício à Polícia Federal

Por Ademar Lopes Junior

A reclamante trabalhou para a empresa do ramo de projetos elétricos de São José do Rio Preto por quase dois anos (de agosto de 2008 a junho de 2010). Sua função era fazer a limpeza do escritório, três vezes por semana, das 7h às 17h, bem como no barracão e no alojamento. Pelo serviço de faxina, recebia R$ 35 por dia trabalhado. Quando houve a inauguração de nova unidade da empresa, a faxineira levou duas colegas para ajudá-la no serviço.

Além do serviço de faxina, ela também lavava, em sua casa, roupas dos trabalhadores que residiam no alojamento, e recebia diretamente deles por isso.

Na 1ª Vara do Trabalho de São José do Rio Preto, na ação movida pela trabalhadora, a empresa se defendeu, dizendo que a faxineira prestava serviços semanalmente, porém apenas uma vez por semana, e que “no barracão novo a reclamante somente atuou na faxina da mudança e depois não mais se interessou pelo serviço”. A empresa afirmou que propôs à trabalhadora que trabalhasse mensalmente, para atuar em três locais, mas ela não se interessou pela proposta e deixou o serviço.

A testemunha da empresa confirmou o trabalho da faxineira apenas uma vez por semana, quando solicitada, e disse que o serviço não tinha dia certo. A testemunha também afirmou que a faxineira não trabalhou algumas semanas e que não tinha horário certo. “Bastava fazer o serviço de limpeza.” Ainda segundo a testemunha, quando a reclamante não era chamada, “os próprios empregados alojados cuidavam da limpeza do local”.

A trabalhadora quis que o seu companheiro fosse ouvido como testemunha, ainda que como informante, mas o juízo de primeira instância indeferiu, “pois evidente o impedimento”. O juízo permitiu, no entanto, que outra pessoa testemunhasse a favor da autora. Essa testemunha, um motorista aposentado, vizinho da trabalhadora (mora na casa ao lado), disse que fazia um “bico, cuidando de um casal de idosos” e “costumava dar carona à reclamante até o trabalho”. Segundo ele, isso ocorria “três vezes por semana, às segundas, quintas e sextas-feiras, às 7h30/7h40, chegando ao local por volta das 8h”. Ele ainda afirmou que “transportou a reclamante ao local de fevereiro de 2008 a março de 2009”.

Diante da evidente inverdade do depoimento da testemunha, pela divergência em relação aos próprios termos da inicial, especialmente no que diz respeito ao período e horários, o juízo mandou expedir “ofício com cópia da inicial e desta ata para a Polícia Federal, visando a instauração do competente inquérito”. E concluiu que foi “provada a eventualidade na prestação de serviço, fato que impede o reconhecimento do vínculo empregatício e, consequentemente, o deferimento dos pedidos formulados”.

A trabalhadora, inconformada com a decisão de primeira instância, recorreu. Segundo ela, o juízo “se precipitou julgando improcedente a reclamatória, apenas por ter se irritado com a constatação de suposto falso testemunho”. Ela ainda ponderou que “a prova oral produzida pela parte adversa também está marcada por contradição (quanto ao trabalho ininterrupto e pedido de demissão, por exemplo)” e insistiu no reconhecimento do vínculo empregatício, lembrando que “a reclamada confirmou o labor entre setembro de 2008 e junho de 2010, sendo irrelevante o trabalho em apenas um dia da semana, em se tratando de atividade-fim do empregador”.

O relator do acórdão da 7ª Câmara do TRT da 15ª Região, desembargador Luiz Roberto Nunes, entendeu que “não há falar-se em nulidade da sentença, eis que o julgador apontou, ainda que sucintamente, as razões do seu convencimento, fundado na eventualidade na prestação dos serviços, extraída da prova testemunhal produzida pela acionada”. O magistrado acrescentou que “cabe salientar que o sistema ou critério adotado para a valoração do conjunto probatório é o da persuasão racional ou do livre convencimento motivado, segundo o qual o juiz, ao decidir, deve condicionar os fatos trazidos na relação jurídica controvertida às provas de tais fatos constantes do processo, como fez o juízo de origem”.

Quanto ao vínculo empregatício e seus consectários, o acórdão destacou que “não se pode conferir qualquer credibilidade ao depoimento da única testemunha trazida pela autora. Não bastassem as flagrantes contradições, inclusive quanto ao início da suposta prestação dos serviços – que acarretaram a determinação de ofício visando à instauração de inquérito para apuração de falso testemunho –, o depoente evidenciou a existência de laços de amizade com a reclamante, tendo em vista ser seu vizinho e lhe dar ‘caronas’ três vezes por semana”. E concluiu que “tal circunstância, por si só, deixa transparecer a parcialidade e a intenção de favorecer a parte, que acabou por ‘irritar’ o juízo a quo”.

O acórdão ressaltou que “de regra, a distinção entre a empregada e a faxineira deve ser feita caso a caso, atentando-se às peculiaridades de cada relação, e, na hipótese em apreço, em que pese o tempo pelo qual perdurou a prestação de serviços (por nove meses), não se poderia ter por caracterizada a necessária ‘continuidade’ na prestação dos serviços”. A decisão colegiada salientou ainda que “no caso, não se cuida de vínculo doméstico, já que a reclamante não laborou em âmbito residencial ou familiar, e sim em benefício de estabelecimento com intuito de lucro”, e que “tal fato, todavia, não necessariamente conduz ao reconhecimento do vínculo de emprego, pois, para a sua caracterização, é necessário o preenchimento cumulativo dos requisitos previstos no artigo 3º da CLT”.

Assim, o acórdão dispôs que “a prova dos autos corrobora a tese de defesa quanto à existência de trabalho autônomo, como faxineira, mediante a paga de valor diário previamente combinado (R$ 35)”, e, ao contrário do que sustenta a recorrente, “a prestação de serviços de limpeza não é inerente à atividade-fim da empresa acionada”. Para a Câmara, “estando pactuada a remuneração por dia efetivo de trabalho, cabe concluir que a reclamante poderia deixar de comparecer nos dias ajustados sem prévio aviso, inexistindo qualquer indício de que, se o fizesse, seria advertida ou punida disciplinarmente. Tal raciocínio conduz à ausência da subordinação inerente à relação empregatícia típica”. E por isso, “diante do conjunto probatório produzido”, o acórdão afastou a configuração do vínculo empregatício entre as partes, julgando assim improcedentes todos os pedidos da trabalhadora. (Processo 0001068-43.2010.5.15.0017)






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