quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

TJ/GO - Não se pode confundir medida socioeducativa com assistência social, diz juíza

Texto: Patrícia Papini

Os trabalhos do segundo dia do Workshop da Infância e da Juventude, que está sendo realizado no Estância Park Hotel, em Anápolis, se iniciaram nesta terça-feira (22), às 9 horas, com Palestra Magna, proferida pela juíza Vera Lúcia Deboni, titular do 3º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre (RS) . Ela discorreu sobre a execução das medidas socioeducativas, expondo e analisando o que considera serem incoerências em sua interpretação e aplicação. Compuseram a mesa diretiva, o 1º juiz-auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás (CGJGO) e coordenador do evento, Carlos Magno Rocha da Silva; o titular do Juizado da Infância e Juventude de Anápolis , Carlos Limongi Sterse, juiz-auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, e o juiz da Infância e Juventude de Luziânia, Roberto Bueno Neto.

Vera Lúcia desenvolveu o discurso tendo, como foco, o questionamento sobre o conceito que as medidas socioeducativas tem no País. “Penso que há crise de interpretação nos tribunais. Não temos uma regra clara, mas fato é que não se pode mais confundir aplicação de medida socioeducativa com assistência social”, frisou. Como observou, apesar de ser signatário da Convenção Internacional de Direitos da Criança, de 1989, a qual integram outros países da América Latina, o Brasil restringe-se à utilização do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que não abarca de forma satisfatória a normatização da aplicação das medidas socioeducativas.

Segundo Vera Lúcia, por falta de uniformidade de conceitos, pairam, no Judiciário, “ideias fixas” a respeito, e uma delas é a de que as medidas socioeducativas privativas de liberdade devem ser aplicadas com função protetiva, terapêutica, de ressocialização e não como tutela de liberdade. “Isso parte de outra ideia fixa, que é a de que o jovem é incapaz de compreender a gravidade de seu ato. Ora, se partimos desse pressuposto, se formos protetivos, estaremos dizendo ao jovem de 12 a 18 anos, que comete ato infracional, que ele é incapaz e que vamos cuidar dele, e não que ele se comportou de uma forma que o Estado não admite e portanto lhe será aplicada medida socioeducativa”.

Para a juíza, diante da ausência legislação mais abrangente e esclarecedora das práticas a serem adotadas, há que se fazer uso das normas constantes da Convenção Internacional de Direitos da Criança. Nesse sentido, Vera Lúcia lembrou algumas delas, notadamente as que versam sobre a vedação da tortura ou de outros tratamentos ou “penas” cruéis, desumanas ou degradantes; necessidade de definição de idade mínima antes da qual a presunção é de incapacidade de infringir leis penais; legalidade e sistema específico; jurisdicionalidade, celeridade e duplo grau; desjudicialização desde que respeitados os direitos humanos e as garantias legais, anterioridade, direito à informação e à assistência jurídica e o princípio da presunção da inocência.

Vera Lúcia comparou tais dispositivos com os artigos 227 e 228 da Constituição Federal, e artigos 108 e 183 do ECA. Falou ainda da “postura pedagógica” do Superior Tribunal de Justiça (STJ), referindo-se às Súmula nº 108, de 22 de junho de 1994, segundo a qual a aplicação de medidas socioeducativas ao adolescente pela prática de ato infracional é da competência exclusiva do juiz; Súmula nº 265, de 29 de maio de 2002, que entende necessária a oitiva do menor infrator antes de se decretar a regressão da medida socioeducativa; Súmula 338, de 16 de maio de 2007, pela qual a prescrição penal é aplicável às medidas socioeducativas, e Súmula 342, de 13 de agosto de 2007, a qual estabelece que, no procedimento para aplicação de medida socioeducativa, é nula a desistência de outras provas em face da confissão do adolescente.

O que podemos fazer, portanto, é aplicar a lei, buscar jurisprudência e aplicar, pois o juiz até pode ser um grande mobilizador social – no sentido de promover discussões para a criação e implantação de políticas públicas, por exemplo – mas sua função, em última análise, é aplicar a lei”, pontuou. Após a palestra de Vera Lúcia, foi aberto espaço para debate.







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